segunda-feira, 27 de março de 2017

TÉCNICA DE SENTENÇA CÍVEL

Depois de me atrever a discorrer sobre como elaborar uma petição inicial e os cuidados necessários ao se estruturar a contestação, passemos a enfrentar a sentença cível e suas particularidades. Não são poucos os detalhes a serem atentados para se esculpir uma sentença de qualidade, objetiva, clara e bem fundamentada, o que exige máxima atenção e zelo do magistrado. Contudo, vemos muitos juízes cometerem erros elementares, o que, lamentavelmente, mostra pouca diligência e desrespeito ao jurisdicionado, ainda que o assoberbamento e as pressões por produtividade possam tentar razoavelmente justifica-los. Por este motivo, o advogado deve ter atenção redobrada, fazendo um pente fino na decisão judicial, para corrigir os equívocos e colocá-la no gabarito, seja por omissão, obscuridade, contradição ou erronia na matéria processual ou de fundo, por meio dos recursos cabíveis. Na verdade, o propósito é elaborar um roteiro prático para estudantes e estagiários consultarem, valendo-me de textos de diversos autores, como Elpídio Donizetti, anotações de aula da Escola da Magistratura e da prática na 48a Vara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.

A sentença é composta de três partes, relatório, fundamentação e dispositivo, cada um exercendo uma função específica.

O RELATÓRIO
O relatório é a história relevante do processo. Deve ser escrito cronologicamente, relatando o que ocorreu no processo, usando a forma narrativa e descritiva, incluindo incidentes. Não é necessário resumir todo e qualquer ato do processo (réplica, alegações finais, por exemplo), a não ser que tenha sido suscitado algo que, antes, as partes não tenham alegado e que o Juiz necessariamente terá que conhecer na sentença. Por exemplo: a parte alega a prescrição antes não alegada nas alegações finais. Deve-se entender a delimitação das questões da lide sobre os quais incidirá a análise do juiz. Não significa a transcrição ipsis literis de alegações impertinentes. Não tem relevância, dentre outras ocorrências, o registro de citação do réu, a menos que não tenha apresentado defesa, porque, neste caso, poderiam incidir os efeitos da revelia. 

Deve ser evitado começar as frases com “que”. Embora até seja prático, não é bom estilo. Cuidado com termos técnicos. Direito é ciência e, portanto, possui um nome específico para designar cada instituto, que assim é reconhecido entre cultores e iniciados na ciência jurídica. Assim, petição inicial é petição inicial, não é peça de começo, não é peça exordial, não é só inicial, assim como contestação não é peça de bloqueio, peça de resistência, ou peça contestatória.

Cuidado com neologismos, palavras que ainda não têm registro em dicionário (dilargar, inobstante, etc.). Cuidado, também, com o arcaísmo, vício que todos os operadores do direito costumam incorrer, que consiste em utilizar palavras em desuso. Vale lembrar que o relatório da cautelar e da ação de conhecimento podem ser fundidos em um único relatório, por economia processual. Cada alegação deverá ser feita em um item separado, em um único parágrafo.

Não se recomenda a utilização, embora corriqueira, da expressão “Feito o relatório, passo a decidir” ou “é o relatório, decido”. Dizer que o relatório foi feito é redundante. Melhor será dividir a sentença em relatório, fundamentação e dispositivo. Fórmula: Eis o relatório. Passo a decidir.

A falta de relatório ou da motivação conduz a nulidade da sentença. A falta de dispositivo leva a inexistência do próprio ato judicial.


Deve conter, na ordem:

1. Nome das partes e o rito pelo qual a ação se processa. Não é necessário o nomen juris da ação, até porque muitos advogados não batizam corretamente as suas ações.
2. A suma do pedido:1° IMEDIATO ð Providência jurisdicional condenatória, declaratória ou constitutiva ð Verbos Declarar, Decretar, Condenar ou Determinar; 2° MEDIATO ð Bem da vida a ser tutelado (Plano onde se encontra a possibilidade jurídica do pedido). Não se admite que o autor pleiteie um direito um direito condicionando-o a ocorrência de evento futuro e incerto. A sentença deve expressar providência jurisdicional certa e incondicionada. Quando se tratar de pedido indenizatório, não vale o autor dizer que quer a condenação do réu eu perdas e danos, sem especificar no que consistem, para que não seja inviabilizada a liquidação. O réu não requer a improcedência, pois não deduz pretensão.

3. Causa de Pedir: REMOTA (Fato mais antigo - relação jurídica) e PRÓXIMA (Conflito de interesses – lesão).

4. A resposta do réu (CONTEÚDO), na ordem em que arguiu.

5. Réplica (caso haja fato impeditivo, modificativo ou extintivo oposto pelo réu e se houver questões preliminares e prejudiciais a serem examinadas).

6. Registro das principais ocorrências do processo.

Por fim, convém ressaltar a determinação que os autos venham conclusos, passando a decidir a controvérsia.

A FUNDAMENTAÇÃO
É o conjunto de razões que levam à decisão. Segue uma ordem lógica, imposta pela técnica jurídica. Além do convencimento das partes e da opinião pública, é por meio da fundamentação que o juiz aprecia livremente a prova, atendendo aos fatos e às circunstâncias constantes dos autos e indicando os motivos que lhe formaram o convencimento, ainda que não alegados pelas partes. Eduardo Couture diz que os teóricos da concepção declaratória do processo nos mostram o juiz como um lógico que fabrica silogismos, que mostra lógica, bom senso e cultura jurídica. A sentença, por sua vez, tem numerosas deduções particulares e os círculos dessas diversas deduções particulares são, por seu turno, outros tantos silogismos. A decisão é, assim, uma espécie de pequena constelação de induções, deduções e conclusões. 

Diversamente do relatório, onde se obedece a cronologia dos fatos, na fundamentação, segue-se a ordem lógica imposta pela técnica jurídica, mesmo porque não seria sensato se conhecer o mérito e depois extinguir o feito por carência de ação. Tal ordem lógica recomenda que cada questão seja discutida em um parágrafo ou um conjunto de parágrafos, com nítida distinção visual de apresentação. Na escolha de cada relação processual a ser examinada, tem prioridade a relação antecedente (por exemplo, a oposição é julgada primeiramente que é pretensão de exclusão das pretensões das partes principais). No exame das preliminares tem o juiz um roteiro nos diversos incisos no Art. 301 do CPC. Evidentemente, espera-se que a natural sequência do processo, com o saneamento difuso em todas as suas fases, fizesse com que, ao final, não tivesse o juiz de direito alguma questão preliminar para conhecer. No entanto, esse ideal é raro de acontecer, pela também natural sucessão de fatos processuais, com notável caráter de mutabilidade da relação.     

A redação deverá ser dissertativa (objetiva) e argumentativa (subjetiva). Dissertação implica discussão de ideias, argumentação, raciocínio, organização de pensamento, defesa de pontos de vistas, descoberta de soluções. Significa refletir sobre nós mesmos e sobre o mundo que nos cerca.  Deve ser evitada a presença de eco, cacofonia, colisão, de expressões surradas, do abuso de advérbios e de outros vícios de linguagem.

 O texto pode ser estruturado da seguinte forma: a) Construção de uma tese (as questões de lide); b) Apresentar argumentos; c) Discutir os pontos controvertidos das teses expostas pelas partes; d) Adequação dos fatos às n0ormas aplicáveis; e) Necessidade de dirimir o conflito e convencer. A tese pode ser defendida com uma única ideia central, mesmo quando exposta com vários argumentos.  Cada tese (ou fundamento do pedido) pode ser desenvolvida em ou mais parágrafos, dependendo do número de ideias centrais utilizadas, e subdivide-se em introdução desenvolvimento (argumentação) e conclusão (amarração).  Esta é uma sugestão de estrutura que torna o texto claro e compreensível; não significa que todos os textos devam obedecer à estruturação sugerida.

O roteiro pode ser resumido assim: 1-Identificar as teses, incluindo a lide secundária, como a denunciação da lide (nem todos os fatos mencionados na inicial e contestação merecem registro na sentença, somente os que tiverem pertinência com o litígio a ser dirimido; 2- Registrar as ideias (nessa fase o que importa é anotar as ideias). Elas vêm, mas também fogem rapidamente. Não se preocupe se elas vêm desordenadas. Depois arruma-se. Tratando-se de assunto de maior complexidade ou sobre o qual se tenha pouco conhecimento, é recomendável fazer pesquisa sobre cada questão a ser debatida; 3- Esquematizar as ideias (estabelecendo as circunstâncias que com a ideia se relacionam, as causas e consequências, a exemplificação, a posição doutrinária e jurisprudencial); enfim, toda a argumentação necessária para justificar ou fundamentar a ideia central.   

Não se conhece do mérito para depois extinguir um processo.

Quando há concurso de ações (reconvenção, intervenção de terceiros, cumulação de pedidos ou causas de pedir) a operação se torna mais complexa, o que exige a organização do pensamento lógico.

Na escolha de cada relação processual a ser examinada, tem prioridade a relação antecedente. A fundamentação da cautelar e da ação de conhecimento é comum.

Nos casos de sentença terminativa o juiz decidirá de forma concisa.

Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento da lide, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a sentença.

Deve ser ratificada ou rejeitada a tutela antecipada requerida.

Motivação é o conjunto de elementos fáticos e jurídicos que levam à decisão.

Questões são pontos controvertidos no plano processual ou plano material.

Julgamento Antecipado ð Deve ser aberto um parágrafo informando que o Juiz está julgando o processo no estado em que se encontra (não se trata de julgamento antecipado), se for as hipóteses do Art. 330 I e II. Se houver provas requeridas, deve ser fundamentado o indeferimento. Quando as partes não pugnam por provas, sendo incontroversos os fatos relatados, daí a conclusão de que as matérias  relevantes para o julgamento da causa não precisam de produção de provas em audiência para a sua solução, reclamando a hipótese o julgamento antecipado (Art. 330 I do CPC). Portanto, comece na fundamentação (E NÃO NO RELATÓRIO) com um parágrafo dizendo que o processo está sendo julgado antecipadamente justificando sucintamente a opção pelo julgamento antecipado. Verificando o Juiz que as provas pelas quais as partes protestaram são inúteis ou protelatórias, o juiz, a quem incumbe velar pela celeridade processual, deve julgar imediatamente o feito. Se as provas são inúteis, o juiz não está julgando a lide antecipadamente. Está julgando no momento em que tinha que julgá-la. Na ausência de prova direta, deve o juiz valer-se de indícios e presunções, construindo um raciocínio lógico em direção a uma conclusão.

Pode ser usada a seguinte redação (fórmula)

o processo comporta julgamento no estado em que se encontra, nos termos do inciso I do Art. 330 do Código de Processo Civil, pois, em se tratando de direito e de fato a matéria controvertida, não há necessidade da produção de provas em audiência, podendo a causa ser solucionada somente mediante a análise das alegações, documentos juntados pelas partes e dos dispositivos legais aplicáveis à espécie”.

DISPOSITIVO
É a conclusão, a parte da sentença que decide a causa. É nele que se expressa o comando estatal que encerra o processo, com ou sem julgamento de mérito. Há dois capítulos: I - Extrai-se o comando que emerge da sentença (extinção, procedência ou improcedência) Se o pedido for julgado parcialmente procedente, deve-se dizer simplesmente que ele é parcialmente procedente, dizendo tão somente o tipo de provimento a ser conferido. Não é técnico dizer que a parte do pedido não acolhido é improcedente, devendo-se, entretanto, deixar claro na fundamentação que o pleito não procede, sem precisar reproduzir no dispositivo. Neste caso simplesmente se omite no dispositivo; II – Ônus sucumbenciais. Não deve ser incluído no dispositivo qualquer resquício de fundamento como muitos Juízes fazem. Ë tecnicamente errado julgar a improcedência do pedido para declarar qualquer coisa, pois o réu, salvo no pedido contraposto e na reconvenção, nada requer senão a improcedência do pedido, simplesmente. As sentenças constitutivas negativas se fazem por meio de decretação, não sendo declaratórias.  O pedido genérico declaratório é vedado (exemplo: “Requer seja declarado o regime de bens do casal, etc.”). O pedido deverá ser especificado. Deve ser evitado dispositivo indireto, remissivo, como, por exemplo: Julgo procedente o pedido nos termos da inicial. Recomenda-se a menção a todos os elementos necessários à liquidação ou ao cálculo: o valor inicial da correção monetária, e data inicial da contagem dos juros, o que evita idas e vindas dos autos ao contador

FECHAMENTO
Data e Assinatura (tem natureza jurídica de autenticidade. É um ato de soberania estatal) Todas as páginas deverão estar rubricadas.
Deve ser consignado o P.R.I. ð Publique-se, Registre-se, Intime-se. A publicação da sentença é havida na entrega da sentença ao escrivão. A intimação ocorre a partir da publicação no DOE.

terça-feira, 27 de setembro de 2016

ALGUMAS DICAS PARA ESCREVER BEM

Escrever é algo que qualquer sujeito alfabetizado consegue fazer. O desafio, contudo, é escrever bem. Para tanto, é necessário o conhecimento da língua, como ponto de partida, o que exige o domínio das regras gramaticais e portar  bom vocabulário, adquirido mediante o hábito da leitura frequente, preferencialmente, de obras escritas por bons autores, envolvendo diversidade temática, pois a cultura é fator de sustentação do comunicador.

Há, em paralelo, outros elementos indispensáveis para alimentar o interesse do leitor, sendo imperativa a adequação estilística, pautada na simplicidade, clareza, objetividade, precisão, organização, concisão, coerência, coesão e, obviamente, correção. 

Simplicidade significa evitar linguagem afetada, expressões arcaicas, rançosas, termos pomposos e artificiais, como “Mui respeitosamente”, “Com a devida e reiterada vênia”, “Ouso divergir do ilustre, culto e zeloso membro do Parquet”, etc. Estas expressões não se harmonizam com o pulsar de nosso tempo, que reclama a atitude de descomplicar. Em vez de “sodalício”, é mais simples escrever Tribunal; em vez de “Pretório Excelso”, simplesmente diga Supremo Tribunal Federal ou simplesmente STF, sua abreviatura; Em vez de Carta Normarum, Constituição é mais inteligível. Para além dessa inclinação ao erudito dos advogados e demais operadores do direito que se dirigem ao juiz, vale dizer que o rebuscamento das decisões judiciais também tem dificultado a aplicação dos comandos da Justiça, tornando a prestação jurisdicional ainda mais morosa e distante do povo.  

Quanto à clareza, leve em consideração que o texto se dirige aos profissionais de direito, às partes e à opinião pública, tendo escopo educacional, formando na comunidade uma consciência jurídica para o cumprimento dos deveres e exercício dos direitos. Portanto, devem ser evitadas as frases longas, a falta de sistematização das ideias, a utilização de palavras que já saíram do vocabulário ativo. A linguagem, dentro do possível, deve ser jornalística, direta a precisa. Devem ser evitados os neologismos, o arcaísmo ou tentar entender o público como homogêneo em sua percepção, sob pena de deixarmos de atingir o objetivo principal: a atenção e o entendimento.

Exige-se, ainda, a organização da ideia, de forma lógica e encadeada, sem o quê dificultaremos a compreensão, por violação da unidade linear do pensamento. Cada parágrafo deve conter apenas uma ideia. Parágrafos longos denunciam confusão mental e falta de senso lógico.

No tocante à concisão, deve o texto conter somente as principais ocorrências, os fundamentos relevantes. E só. Evite inflá-lo com ideias desarticuladas que não se refiram ao assunto, o que leva ao efeito lateral de desviar o foco.

A coerência é outro atributo indispensável ao bom escritor. Ser coerente é ser lógico ao trilhar o raciocínio, é se fazer entender, e, mais, convencer e persuadir, é estabelecer um nexo entre ideias, harmonizar as frase em um contexto, é equalizar o ânimo. 

Já a coesão é o poder de conduzir a ideia em um mesmo bloco temático, não mudar drasticamente de assunto entre os parágrafos, é impor que as palavras, as frases e os parágrafos estejam entrelaçados, um dando continuidade ao outro.

Para dar precisão à redação, devem ser utilizadas palavras e expressões adequadas, que definam com perfeição a ideia que se pretende transmitir, o fato que se pretende narrar. A precisão não se confunde com tecnicismo, com linguagem hermética. Às vezes é preciso ser técnico, lembrando que as decisões judiciais devem ser dirigidas aos jurisdicionados que nem sempre têm o domínio do “juridiquês”. Por outro lado, o termo técnico, se tem a desvantagem de não ser compreendido por todos, tem a vantagem de fixar um sentido preciso para a palavra, e todas as ciências e profissões têm o seu jargão, porém, no direito, isso é mais complicado. Em resumo a linguagem deve ser clara e acessível.

Por derradeiro, é fundamental rever sua escrita, buscando correção, eliminando erros gráficos (materiais). Neste sentido, deve se atentar para os desacertos que eventualmente possam ter passado despercebidos, ficando atento à concordância, às regências - verbal e nominal -, à colocação de pronomes, etc. Em se tratando de linguagem culta, é necessária a observância escorreita das normas gramaticais. Deve se olhar com atenção a grafia das palavras, sobretudo as homófonas (cessão, sessão seção), homógrafas (como sede, colher acordo) as parônimas (infligir e infringir), que nos levam a errar o seu correto uso. Para evitar embaraços, tenha sempre um bom dicionário por perto. Por fim, procure estudar o uso dos sinais de pontuação, para evitar ambiguidades e desvios semânticos. 

Com base nesses parâmetros, teremos as ferramentas iniciais para uma escrita interessante. E o estilo, que é o modo como as pessos usam os recursos linguísticos para se expressar? Bom este é construído costurando-se cada um dos componentes técnicos da escrita, associados ao conhecimento do escritor e é único em cada sujeito.

Feito esse prefácio, lanço-me, de forma articulada e compendiada a apresentar dicas valiosas para tornar o seu texto elegante e com o apelo essencial à atenção do seu público alvo. Como o blogue é jurídico, farei as adaptações exigidas para a escrita nesta área.      

1. O que, quem, quando, onde, como, por quê – Os trabalhos sobre escrita jornalística sugerem que a notícia deve ser apresentada ao público, respondendo a este lead,  ou seja, a essas perguntas. Bem observada essa regra, o leitor terá um panorama global dos fatos tratados, sem conceder dúvida ao que ocorreu no mundo real. É bem verdade que não é um padrão aplicado na redação jurídica, em que, na maioria das vezes, o texto é argumentativo, embora tenham o seu valor na narrativa dos fatos e na formatação da peça postulatória, que deve se orientar sob diversas regras ditadas pela norma processual, senão vejamos: o “o quê”, o “como” e o “por quê” referem-se aos fatos, à causa de pedir; o “quem” dirige-se à pertinência subjetiva para integrar a relação de direito material, também chamada legitimidade; o “quando” é importante para se delimitar a prescrição, e o “onde” estabelece uma delimitação de competência territorial. Poderíamos acrescer o “quanto”, como medida quantitativa do pedido.

2. Organize um draft sobre o que irá escrever e depois ordene – Draft é rascunho. Tenha o hábito, quando estruturar uma peça jurídica, de tomar ciência detalhadamente do caso, já promovendo as anotações marginais, em memorando, dos principais pontos que serão debatidos, como artigos de leis, doutrina pertinente, decisões nas Cortes de Justiça e os subsídios derivados dos fatos em discussão. A ordenação é o passo seguinte. Costumo usar o silogismo, como técnica de apresentação dos argumentos, oferecendo a lei, a doutrina e a jurisprudência na frente, como premissa preliminar, os fatos em um segundo momento, como premissa secundária e, por fim, a conclusão, dedução lógica da harmonização das duas premissas anteriores.  

3. Reduza o texto objetivamente – Textos grandes dificultam o aprisionamento da atenção do interlocutor. É necessário que se aprenda a desbastar toda ideia que não acrescente valor ao texto. Esta tarefa inclui a supressão de palavras desnecessárias. Facilite o trabalho do juiz e da contraparte, seja breve, objetivo e direto. Despreocupe-se em esparramar sua cultura jurídica do assunto, se for desnecessário e não tiver um propósito específico. Seja pragmático, faça a sua caçada com uma “funda”, e deixe o fuzil para quando quiser escrever uma monografia ou uma obra literária.

4. Cheque legitimidade das informações – Muito cuidado com as credenciais da informação que você apresenta. Utilizar informações inconfiáveis é um “tiro no pé”. Você passa toda uma vida buscando construir confiança e uma informação sem base factual poderá dissipar sua autoridade em um breve segundo. Pesquise, dê sustentação e quilate aos seus argumentos com apoio na verdade! That´s the point.

5. Informações mais importantes na frente (pirâmide invertida) e o fecho deve ser impactante – Há escritores que preferem deixar para o final da frase a ideia de impacto. Outros preferem causar frisson logo no início da frase. De maneira geral, nos livros sobre escrita, a recomendação é que o essencial venha na frente, como o carro de boi. Conta-se a estória do fim para o começo, colocando-se as informações mais importantes logo no primeiro parágrafo. Essa técnica predispõe o leitor a enfrentar o texto. Contudo, sempre finalize com uma ideia impactante, para que o leitor sonhe com tudo que escreveu. Esse estilo, ou técnica, chama-se de pirâmide invertida.  

6. Palavras simples, sem complicações, linguagem clara, informação precisa e estilo atraente – Use palavras simples, mas evite o prosaísmo, porque a  simplicidade não tem o mesmo sentido de banalidade. O objetivo é formar o entendimento do destinatário quanto ao seu trabalho, estabelecendo um canal bidirecional e harmônico em que o que se fala tem o mesmo sentido do que se compreende. É tarefa das mais árduas, mas com o treino, você consegue. Portanto, descomplique, use palavras usuais, corriqueiras, de uso recorrente no seu público alvo. Violar a regra da simplicidade é como se você entrasse em uma festa casual trajando um smoking. Pode ser bonito, mas vai parecer pernóstico, criando isolamento. Sobre o estilo, construa o seu, com muito cuidado. Procure “explorar” a criatividade, use metáforas e outras figuras de linguagem – pontualmente - e com moderação, sem repetir expressões já batidas e sedimentadas no gosto popular. Invente as suas. Há textos que exigem abstração, e esses símbolos retóricos auxiliam a enfeitá-lo e despertar o leitor par a sua inteligência.   

7. Toque humano ao texto, como se o leitor estivesse à frente – A linguagem escrita se distancia da falada, pelo tom, pela maior formalidade e pela impessoalidade. Ao escrever, crie uma imagem mental de seu leitor. Faça de conta que ele esteja ali, bem à sua frente. Dirija seu texto da mesma forma com que você fala com seu interlocutor. Meça as palavras e muito cuidado com as de baixa densidade, ou seja, com o coloquialismo excessivo. Seja natural, persevere no esforço de uma comunicação fluida e fácil. O ideal é que fique no meio termo entre a linguagem formal e a informal, assim, o alcance é bem mais amplo. 

8. Evite palavras desnecessárias – Essa é a regra de ouro da escrita e vale para qualquer tipo de texto. Corte o excesso, pode os exageros verborrágicos, decote a jactância vocabular. Seja direto, sem perder a linha e a objetividade. Podemos estender esse espírito de contenção às frases. Não desperdice sentença, quando a ideia nela inserida é vaga , evite-as quando desconexas e que apenas adensam o texto e o parágrafo, sobretudo, porque servem apenas para irritar leitores inteligentes, por não exercerem qualquer função temática. Alguns exemplos podem ser oferecidos, como “Doenças de características sexuais” dando lugar a “doença sexual”, “Curso em nível didático” por “livro didático”, etc. 

9. Frases curtas reduz os erros e tornam mais claro o texto – É muito comum e elementar nos depararmos com petições, de cujos parágrafos são intermináveis. E o pior, a frase inicia bem e, repentinamente, muda de assunto, uma duas, várias vezes, para ao final concluir com uma ideia desengajada do assunto que motivou a sentença (não me refiro aqui à decisão judicial que põe fim a uma fase processual, mas à própria frase). Faça o seguinte, reduza o tamanho da oração para dizer o essencial. Se julgar que ela não está completa, expressando tudo o que quer dizer, produza outra frase em sequência, quantas forem necessárias para esgotar o tema. Você verá que ficará muito mais inteligível e clara a ideia que quer apresentar. Proponho o seguinte exercício para entrar no ritmo: pesquise frases grandes em livros, e depois as decomponha em tantas outras quanto forem necessárias. Você terá a constatação que ficará melhor do que o original.     

10. Substitua gerúndio por ponto – O gerúndio é uma forma verbal que deve ser evitada. Fica feio. Na linguagem coloquial, há pessoas que gostam de usar a locução verbal “estar fazendo”, sobretudo os operadores de telemarketing. Jamais use essa expressão. É de péssimo gosto, sem prejuízo de ser errado sob o ponto de vista gramatical. Às vezes, o gerúndio funciona como um conectivo para outra oração. Experimente trocá-lo por ponto, subdividindo a frase em duas. Soa melhor. Por exemplo: “Meu carro costuma apresentar problemas no freio, podendo provocar situações de risco no trânsito.” Veja como fica melhor: Meu carro costuma apresentar problemas no freio. Isso provoca situações de risco no trânsito.    

11. Não use o "já que". Substitua por ponto – A regra é similar à de cima. Vamos ao exemplo: “Comerei agora, já que a comida está pronta.” Como ficará: Comerei agora. A comida está pronta. Não é errado o uso do “já que”, mas não se trata de uma expressão que os escritores costumam adotar. Você pode usar em lugar dessa expressão o “pois” e o “porque”.   

12. Corte as frases coordenadas e isole as orações – Na verdade, esses três últimos pontos são especificidades da regra geral de reduzir o tamanho da frase. Melhora a compreensão, trata-se de fragmentar a oração longa.

13. Troque oração adjetiva por adjetivo – Mais uma regra para economizar palavras. Em vez de Animal que se alimenta de carne, usemos apenas a palavra “carnívoro”. O objetivo é não entediar o juiz!

14. Substitua a oração pelo termo nominal – Ok, ok, você está sendo repetitivo, eu não gosto disso! A finalidade é essa, criar a cultura reducionista! Portanto, substitua “A comunidade exige que Lalau seja punido” por “A comunidade exige a punição de Lalau”. Criar esse hábito, no início, é difícil, mas logo você se acostuma. E sabe o que mais? Você passará a odiar textos muito longos. Vamos apostar?

15. Palavras curtas e simples– Buscamos a redução da redação, não é mesmo? Se podemos cortar palavras desnecessárias, ideias extravagantes, também é fácil encontrar vocábulos de uso mais frequente para substituir seu sinônimo mais pomposo. Veja alguns exemplos: somente por só; féretro por caixão; óbito por morte; morosidade por lentidão e matrimônio por casamento. A ausência de luxo e rebuscamento implica em elegância, pois atende a todos os gostos e classes, além de criar rapport, uma frequência comunicacional fluídica, sincronizando duas pessoas no mesmo grau de atenção, sem contar que atrai a simpatia do leitor.

16. Sentenças positivas!!! – A palavra “não” tem uma carga negativa na comunicação. Desculpem o truísmo, a repetição, o pleonasmo, mas se trata de uma dedução óbvia. Evite usá-la. Seja assertivo, positivo, seguro, pois é muito mais contundente, carrega mais energia e ênfase na ideia veiculada. Vamos tentar? Em vez de Ele não acredita no Ministro”, use “Ele duvida do Ministro”. Pronto, qual a melhor alternativa para fazer crer que o Ministro carece de confiança?

17. Voz ativa!!! – Esta é uma dica que todos os livros de escrita apresentam. O sujeito deve praticar a ação, não deve deixar que a pratiquem por ele. Ele é o protagonista do enredo e por que coadjuvá-lo? Exemplo? O gato comeu a ração é muito melhor do que a ração foi comida pelo gato. O agente deve estar no epicentro da ação e deve ser corajoso para se apresentar na “linha de frente da batalha”. 
  
18. Termos Específicos – A clareza de suas ideias liga-se à precisão com que você escolhe as palavras para traduzi-la. Use dicionários e enciclopédias eletrônicas (ou físicas, se é que ainda existem). Se for escrever sobre economia, por exemplo, procure entender o significado de certas expressões afetas a este segmento, como macroeconomia, elasticidade da demanda e outros. Em vez de lutar com as palavras, traga-as para o seu lado, transforme-as em suas parceiras de trabalho. Para isso, você terá que se entrosar com os seus sentidos. Se for imprescindível você usar um vocábulo desconhecido do público em geral, o melhor a fazer é traduzir o seu significado.    

19. Falar e Dizer não são sinônimos. “Dizer” é declarar algo importante; Falar é dizer palavras sem compromisso com a qualidade do que se exprime. Falou com X (o quê, não sabemos!!!), porém disse que iria aumentar os salários. Sacou? Falar é vago e dizer é preciso!

20. Acontecer – Essa palavra significa suceder de repente (inesperadamente). Usar esta palavra para comunicar um fato qualquer é equivocado e representa uso semântico questionável. Se não for repentino o fato, use os verbos ocorrer, realizar, haver, suceder, existir, verificar-se, dar-se, enfim, adapte à sua necessidade, para não “acontecerem” críticas inesperadas.

21. Livre-se dos verbos multifacetados – Há verbos que apresentam uma multiplicidade de significados e se amoldam a muitas situações, quando você está com preguiça para escolher um melhor, como ocorre com o verbo inglês “get” que significa quase tudo naquele idioma alienígena. Na dúvida do verbo a ser usado, mande um “get” que ele deve funcionar, mas se quer escrever com estilo, livre-se dele. E no vernáculo (nossa língua) quais são esses vilões? Ok, citaremos os mais comuns: fazer, por, dizer, ter e ver. Não faça uma fossa; cave uma fossa! Por uma palavra? Melhor acrescentar. Dizer poemas? Declame-os! Ele tem uma boa reputação. Na verdade, ele goza de uma boa reputação. Viu a beleza do quadro? Admire-a. Capisce?

22. Use palavras concretas, menos globais – Há palavras mais exclusivas para descrever uma situação do que outras. Procure ser menos genérico, salvo se você tomar medicamentos muitos caros e não tiver disponibilidade econômica. Brincadeiras à parte, em vez de trabalhador, que é geral, diga jornalista, operário, lixeiro ou qualquer profissão específica. Se vir um pedestre, refira-se a ele como uma mulher, homem, idoso. Gonçalves Dias escreveu que na terra dele tinha palmeiras. Falou em árvores? Garanto que a cena ganha muito mais cor e dinâmica quando detalhamos mais personagens e cenários. O específico é muito melhor do que o genérico, o concreto ao abstrato, o definido ao vago. Consiga variedade, propriedade, riqueza, negue monotonia, vagueza e indigência.

23. Cuidado com os exageros numéricos – O exagero é uma figura de linguagem chamado hipérbole. É bastante usado e tem o seu valor circunstancial reconhecido. Contudo, quando lidamos com números e estatísticas, cuidado para não calibrar demais a informação. Mostra descuido, negligência. Se você for superafetado, o juiz vai desconfiar na sua autenticidade, contaminando sua credibilidade.  

24. Restrinja os adjetivos - Substantivo e adjetivo são quase inimigos. O adjetivo deve ter a habilidade de especificar melhor o substantivo, tornando-o menos abrangente, tem que ser frio e objetivo ao qualificar, despojado da percepção subjetiva, como “meninos estudiosos” (é um fato) e “mesa redonda” (não há outra forma de enxergá-la). Esquive-se de atribuir seu conceito pessoal ao objeto, como é o caso de “meninos maravilhosos”, “mesas modernas”. Seriam, mesmo?

25. Não use chavões e clichês – Usar clichês é um hábito dos maus escritores, revela aridez criativa. Chacoalhe a cabeça e tire dela todas as novidades que você pode construir. Saia da mesmice e não repita o que todo mundo faz. Saia do comum e invada os domínios da inovação ou você vai continuar a usar termos como “calorosa recepção”, “fortuna incalculável”, “inflação galopante”, “perda irreparável”, “sonora vaia”, “vitória esmagadora”?

26. Finja que no idioma só existam substantivos e verbos – Essa convicção vai fazer com que você aprisione o adjetivo em uma zona da sua malha neural inalcançável à memória. Ao evocá-lo, certifique-se que ele esteja dormindo um sono profundo e jamais seja acordado. Deixe-o ali, e não tente um habeas corpus para soltá-lo. Outro “inimigo do rei” é o advérbio; e como advogado adora essa classe! Ele precisa enfatizar, dar energia à sua frase... mas por desconhecer a boa técnica de comunicação (ou até por preguiça mental), ele apela para o advérbio. Então, ele passa a ser pródigo no uso dos “tremendamente”, “absolutamente”, “inegavelmente” e outros. Por que tanta insegurança? Você acha que o juiz vai se impressionar com a sua “mente”? Que tal sair da zona de conforto e botar a cabeça para trabalhar? Ele vai se impressionar é com as provas, o advérbio deve estar concretizado em cada elemento que você leva aos autos para convencer o juiz, o que deve ser aliar ao bom argumento da sua petição. Forma tem valor relativo, mais importante é o teor da mensagem! O conteúdo é superlativo!  

27. Persiga a frase enxuta, eliminando palavras desnecessárias – Já consignei a necessidade de se privar do uso de advérbios e adjetivos, não é mesmo? Mas há outros elementos, de cujo uso deve se dar com cuidado e moderação, como artigos indefinidos, pronomes possessivos, demonstrativos e indefinidos. Rapazes e moças, cultores da língua castiça, o que sobra? Resposta: a boa escrita. Exemplos? Fabio espera (uma) resposta de sua carta; Viu como poupamos nossos olhos?

28. O possessivo pode levar a confusão da referência na frase. Em relação aos pronomes, o alerta é necessário por causa da confusão que provocam, quando há muitos personagens na cena. Nunca se sabe, por exemplo, se um determinado objeto pertence a algum dos envolvidos pelo posicionamento desses termos na oração. Vamos ao exemplo: Dilma ensinou Fernando Henrique a usar alguns recursos de seu celular. Celular de quem, cara pálida, de Dilma ou de Fernando Henrique? Seria melhor usar o “dele” ou o “dela”.

29. Seja conciso - Ser conciso difere de ser lacônico, tendo o sentido de densidade, e não se confunde com o vago, impreciso ou até mesmo prolixo. Quando se é denso, cada palavra tem valor indispensável à projeção da ideia. Nos itens seguintes, damos alguns casos mais específicos envolvendo esta proposição. 

30. Nas datas, dispense as palavras, dia, mês e ano – Em vez de dizer “No dia 20 do mês de janeiro do ano de 1970”, diga, simplesmente, “Em 20 de janeiro de 1970”. Viu? Encurtou a sentença e disse a mesmíssima coisa!  

31. Substitua locução adjetiva por adjetivo – Trata-se de mais uma técnica voltada para o comedimento linguístico. Em vez de material de guerra substitua por bélico, pessoa sem discrição por indiscreta, por exemplo.  

32. Troque a oração adjetiva por nome – Que tal trocar a oração por um nome que traduz o contexto que você quer informar? Elimine “pessoas que se alimentam de verduras” por vegetariano ou criança que não sabe ler por analfabeta. Seja sucinto, cause mais impacto!

33. Corte o "que é" o "que foi" e o "que era" – Trata-se, aqui, de “passar a foice” nesses conectivos, que pretendem inflacionar a frase e quebrar a sua harmonia e linearidade. Veja como fica bem melhor. Em vez de dizerA população de Washington que é a capital dos EUA é negra” você deve encher o pulmão e escrever “A população de Washington, capital dos EUA, é negra”.

34. Substitua a locução verbo + Substantivo pelo verbo – Aparentemente, a tarefa de talhar o texto é complicada, mas com treino, passa a ser automática, você cria o hábito de se autoconter na sua dissertação. Poxa, que exemplo caberia sobre este ponto? Vamos a eles, então: Em vez de “Fazer uma viagem”, diga somente “viajar”; Substitua o “Fazer música” por “compor” ou, para finalizar, elimine o “Por em ordem as ideias” e escreva “ordenar as ideias”.

35. Busque a frase harmoniosa. O enunciado tem que agradar aos ouvidos, combinando palavras e alocando-as de forma inteligente na frase, entrelaçando-as sem tropeços, ecos, intercalações, cacofonias ou repetições. A frase precisa impressionar bem os ouvidos, produzindo um som agradável, como uma música harmoniosa. O curto deve vir na frente! Depois alongue. É como a marcha do carro.

36. Mistério dos 3!!! Ao pretender dar algum exemplo ou fazer alguma citação, faça-o usando 3 fatores, como “Cheguei, vi e venci”. Trata-se de técnica de estilo. Usar dois, quatro ou seis é correto, mas não é tão harmônico. A exemplificação trinária soa melhor aos ouvidos.

37. A intercalação de frases longas e curtas quebra a monotonia – Sabemos que há pessoas com dificuldade de achatar suas frases e parágrafos. Se for muito difícil, então, procure interpolar frases longas com frases curtas, o que ajuda – e muito – o cansaço visual de percorrer a longitude textual. 

38. Não inicie as frases do parágrafo ou em parágrafos subsequentes com a mesma classe gramatical – Talvez seja esta a regra mais difícil de ser observada, sobretudo, quando há tantas regras a serem seguidas, não é verdade? Mas há uma forma de você não burlá-la: negrite sempre a primeira palavra do parágrafo. Depois percorra o texto. Na verdade, não se deve repetir a mesma classe no parágrafo (ou na frase) subsequente, senão em dado momento teríamos que parar completamente de escrever por falta de alternativa.

Pessoal, todas as regras aqui apresentadas foram sugestões tiradas de alguns livros sobre escrita e na prática de 20 anos como advogado e assessoria de juízes criminal e cível. Tive apenas o trabalho de compilá-las e apresentar em um formato bem simples e objetivo, porque o propósito é trazer à luz a técnica usada pelos grandes escritores. É óbvio que você terá que adaptá-las ao tipo de escrita adequada ao seu meio ou a finalidade, porque se trata de um padrão o qual, em alguns raros casos, deve ser evitado, ou seja, a regra não é monolítica, caso contrário teríamos trabalhos enfadonhos e estereotipados. 

Se você tem o hábito de escrever muito, penitencie-se por isso. É o momento de uma autocrítica e faça-o de imediato. Com o passar do tempo, seu estilo acaba mudando, quando você passa a enxergar que, na ponta, o juiz não tem muito tempo e paciência para ler com atenção a sua petição. Vale um alerta: o desafio não é apenas escrever pouco, mas também com profundidade. Esse é o “ás na manga” que deve ser utilizado sempre!!! 

Espero que vocês tirem proveito e façam bom uso dos conselhos apresentados neste trabalho. Tenho certeza que seus amigos aplaudirão sua iniciativa.  

terça-feira, 25 de novembro de 2014

Cuidados ao elaborar uma contestação


A contestação, como já devem saber, é apenas uma das formas de resposta processual, ladeada pelas exceções, impugnação ao valor da causa, impugnação à gratuidade, impugnação ao litisconsórcio, arguição de falsidade, nomeação a autoria, denunciação da lide, chamamento ao processo, declaratória incidental e reconvenção.
No artigo de hoje, iremos nos ater apenas na contestação e nos correlatos cuidados que devemos ter ao elaborá-la. Nessa perspectiva, faremos, pontual e articuladamente, algumas observações que servirão de parâmetro para a construção de uma defesa sólida.

O primeiro passo a se dar no delineamento da resposta é fazer uma leitura percuciente, aprofundada, da petição inicial, verificando se há preliminares a serem arguidas, que tratam de questões processuais. Conquanto seja recomendável levantar um capítulo para abordá-las, é importante destacar que o Juiz pode examiná-las, em  qualquer tempo e grau de jurisdição, em se tratando de questões de ordem pública - com exceção da preliminar de convenção de arbitragem. Mesmo que a parte interessada não se pronuncie a respeito delas, o juiz pode fazê-lo de ofício, como autoriza o art. 301 § 4° do Diploma Processual.

As preliminares estão elencadas taxativamente no art. 301 do Código de Processo Civil: Inexistência ou nulidade de citação; incompetência absoluta; inépcia da petição inicial; perempção; litispendência; coisa julgada; conexão; incapacidade da parte, defeito de representação ou falta de autorização; convenção de arbitragem; carência da ação ou falta de caução ou outra prestação que a lei exige como preliminar.

Ultrapassada essa etapa, deve o operador do direito atentar para as chamadas prejudiciais de mérito, alguns preferindo chama-las de preliminares de mérito, como ocorre com a decadência e a prescrição. O Juiz, agasalhando a preliminar de mérito, não necessita enfrentar a pretensão material deduzida. Se o fizer, tratar-se-ão de anotações marginais, o que se convenciona chamar de Obter Dicta (ou Dictum - no plural). É bem verdade que parte da doutrina rechaça conceber a prescrição como questão de ordem pública, porque pode ser renunciada pela parte a quem ela aproveitaria, além de ser válido o pagamento de dívida prescrita, não assistindo o pedido de restituição. Contudo, a Lei entende de forma diferente, portanto, como devemos subordinação ao direito, devemos trabalhar a questão de forma estrita, dentro das balizas da norma.

Por derradeiro, deve o réu defrontar o mérito. Para tanto, há dois artigos básicos que devem ser memorizados: o art. 300 e o art. 302 do CPC.

No primeiro dispositivo, encontra-se implícito o princípio da eventualidade, também conhecido como concentração de defesa. O que se depreende da regra? Significa que cabe ao réu formular toda a sua defesa na contestação, caso contrário, perderá a oportunidade de fazê-lo, posteriormente. Ainda que as alegações sejam excludentes, deve-se proceder assim na contestação. O Código confere ao réu apenas no momento da contestação a possibilidade de consignar todos os argumentos contrários à pretensão, direta ou indiretamente. A omissão do patrono do réu quanto a algum ponto de defesa que poderia ser suscitado leva à preclusão temporal, resultando alguns efeitos que logo abordaremos.

No segundo dispositivo citado, o art. 302 do Código Processual, encontra-se um outro princípio fundamental de defesa: o Princípio da Impugnação Especificada. Traduz-se esse postulado a não admissão de formulações genéricas de defesa, por meio de negativa geral dos fatos apresentados pelo autor. Cabe ao réu impugná-las pontualmente, sob pena de o fato não-impugnado ser havido como existente. Esta fórmula não se aplica quando a defesa tiver sido apresentada por advogado dativo, curador especial ou membro do MP (Art. 302, parágrafo único).

A consequência, como as exceções abaixo e acima mencionadas, da não impugnação especificada dos fatos é a presunção relativa de veracidade dos fatos apresentados pelo autor em sua inicial.

A não impugnação especificada, em algumas situações, não produz o efeito de reputar-se ocorrido o fato não impugnado. São os casos: Se a respeito do fato não for admissível a confissão, como os direitos indisponíveis; se a petição inicial não estiver acompanhada de instrumento público que e lei considerar da substância do ato; se os fatos não-impugnados estiverem em contradição com a defesa: quando o réu contesta apenas alguns dos fatos alegados pelo autor, mas da impugnação destes decorre implicitamente a rejeição dos demais, por incompatibilidade lógica entre o que foi arguido e os atos não apreciados pelo contestante.

Respeitadas as premissas acima, sugiro estudar o caso e destacar quais os artigos da Constituição, da legislação infraconstitucional, atos normativos aplicáveis, além de trechos doutrinários e da jurisprudência que se aplicam ao caso, sobretudo se a questão for extremamente controvertida.

O arremate da peça exige o pedido de extinção do processo sem julgamento de mérito, caso alguma das preliminares seja acolhida ou, uma vez vencidas, o pleito de improcedência do pedido, sem o quê torna-se inócua a defesa.  

Em que pese a necessidade ao apego a Lei, em sentido lato, sempre há espaço para a criatividade do operador do direito, cabendo, neste passo, o chamado argumento de lege ferenda, que se baseia em uma suposta lei a ser criada, dada a razoabilidade e o sentido de equidade e justiça nos fundamentos apresentados, pois muitos artigos de lei são incorporados ao ordenamento jurídico a partir de valores axiomáticos construídos por seus membros, a partir da mudança do comportamento social. Por isso, é muito importante o advogado promover, além da leitura técnica – que deve fazer parte de sua rotina diária – um aprofundamento de sua cultura geral, dedicando-se ao estudo multidisciplinar pesquisando diversos veículos de informação, para que fique antenado com o que se passa no mundo e em sua comunidade, o que o permitirá construir uma sociedade mais justa e solidária.   

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

Dicas de como fazer uma petição inicial

Pessoal, entraremos, hoje, no campo da prática da advocacia. Procurarei, em linhas gerais, ensinar os cuidados que temos que ter ao elaborar uma petição inicial, o nosso instrumento material da demanda. Serei breve e objetivo.
 
Em primeiro lugar, esqueçam os modelos. É certo que eles dão um parâmetro interessante de consulta, sob o aspecto das formalidades indispensáveis, mas não são capazes de levar o advogado ao êxito, afinal, o autor de peças estereotipadas, que constam dos livros e mídias especializadas,  não conhece o caso a ser levado a juízo, portanto, não é capaz de dizer como explorar os recursos de argumentação, que são inerentes à personalidade do advogado. É na retórica que está o grande poder de convencimento do advogado, não na forma em que ele leva a pretensão às raias do judiciário, embora rituais de forma devam ser observados, por exigência legal. De toda a sorte, vamos às recomendações para se ter uma peça tecnicamente aceitável, de qualidade, e que predisponha o magistrado à leitura, o que já representa uma grande vantagem.

Em primeiro lugar, precisamos, ao atender o cliente, registrar com detalhes todos os elementos jurídicos que comporão a arena de disputa, o litígio, o foro onde as partes guerrearão por suas causas.  Após este contato, deve-se criar um filtro, eliminando todos os itens sem relevância jurídica à questão de fundo, pois é extremamente necessário sermos objetivos ao nos dirigirmos ao juízo.

De posse do "case", comecemos a peça pelo endereçamento. Não me aterei a regras de competência, mas o direcionamento da peça ao juízo competente exige, mutatis mutandis,  a consulta a Constituição, para saber a competência de Justiça, do Código de Processo Civil, para a competência de foro e ao Código de Organização Judiciária, o que nos dará subsídios para delinear a competência do juízo. Vencida essa etapa, deve o operador qualificar as partes, fornecendo o endereço de seu escritório para eventuais intimações. É bem verdade que o processo eletrônico vem esvaziando um pouco essa exigência, pois as intimações ao advogado são feitas internamente, pelo sistema de acompanhamento mantidos pelos Tribunais em seus sites, carecendo, regra geral, do oficial de justiça e dos correios para efetivar a diligência de comunicação dos atos processuais.

Partiremos, então, para a apresentação dos fatos, que é integrado pela causa de pedir remota, ou seja a relação jurídica de direito material que vincula as partes e a causa de pedir próxima, ou seja a lesão ao direito. E como o fazer? Em minha experiência, venho observando que as pessoas têm uma grande dificuldade de se expressar. Falam bem, conseguem dominar a oratória, mas, na hora de passar as ideias para a linguagem escrita, não logram organizar o raciocínio, o fazem de forma canhestra, usando frases, parágrafos e até locuções desconexas, desarticuladas e sem sentido. Escrever bem é uma arte que pode ser dominada com simplicidade se procurarmos não complicar. É esse o segredo, devemos ser "humildes", evitando rebuscamentos, usando frases curtas e diretas, interditando aquelas expressões pernósticas, que mais do que mostrar erudição, revela inexperiência e insegurança. Vale lembrar que a frase seguinte deve procurar ser a continuação da ideia contida na frase anterior, subsidiando-a , complementando-a ou finalizando-a. Essa interligação chama-se coesão e é um imperativo para um texto inteligível. Quando precisar mudar de assunto no tema, use outro parágrafo. Neste particular, use quantos parágrafos forem necessários, mas desde que haja algo importante a ser dito que não possa ser dispensado. Lembre da premissa inicial: sejamos objetivos e diretos, o que significa podar excessos.

A linguagem técnica, os jargões a aforismos devem ser utilizados com moderação e pontualmente. Jamais invente uma frase para inclui-los. Só os use se for impositivo e o pensamento expresso invocá-lo como uma essencialidade. Se houver alguma expressão de uso coloquial que possa substituir uma expressão em latim, não hesite em usá-la. Por exemplo, em vez de falar, ab ovo,  use "inicialmente", pois a nossa língua é o português e a Constituição e o CPC impõem o uso do vernáculo. A verborragia, além de tornar feio o texto, mostra vaidade e pouco sentido prático. A simplicidade é uma poderosa aliada da comunicação.

Costumo, sempre que possível, usar a técnica do silogismo, ou seja, o uso da argumento dedutivo, como técnica argumentativa. Usam-se: as premissas maiores, nas quais devem ser citadas as normas aplicáveis ao caso, a doutrina que se debruça sobre casos similares e a jurisprudência; descrevo os fatos, consubstanciados nas premissas menores (onde estão contidas as causas de pedir remota e próxima) e concluo, estabelecendo um passadiço entre as premissas, subordinando os fatos ao direito aplicável, dizendo ser o autor merecedor da tutela jurisdicional que está sendo invocada.

Não obstante, cada um tem o seu estilo, e o importante é uma perfeita exposição do caso, apresentando os fundamentos de fato e de direito, com aparelhamento das provas que estão sendo exibidas antecipadamente (pré-constituídas) ou que serão oportunamente produzidas no curso da instrução.

Abro um parênteses para dizer que muitos profissionais têm fetiche pelo capítulo relativo aos direitos, onde citam todas as normas aplicáveis a doutrina e a jurisprudência, ao final da peça. Atuei como assessor de juiz cível e criminal e posso atestar com toda a confiança, trata-se de um erro a evitar, pois o juiz passa por cima dessa parte como "um trator", afinal, da mihi factum, dabo tibi jus (exposto o fato, o juiz confere o direito). Se quiser destacar a norma a ser observada, o que os autores dizem sobre a controvérsia ou destacar a jurisprudência sobre o caso, faça-o no início da peça, ou, até melhor, ao longo da apresentação dos fatos,  permeando-os na narrativa. A possibilidade de o juiz considerar a autoridade de tais elementos é bem maior. Use alguns negritos e sublinhados, sem abuso.

Após o exaustivo registro do fato controvertido, cuidemos do pedido, que usarei no sentido lato, para a finalidade, em paralelo à pretensão, de alcançar a citação, provas e valor da causa, que, em regra, constam do respectivo capítulo. Entendo que seja um ponto que merece muita atenção e cuidado. Há muitos profissionais que deduzem os fatos de forma impecável, mas não sabem fazer o pedido. Esquecem do básico e o fazem de afogadilho, atabalhoadamente, como se quisessem se livrar desse mister, de importância capital ao Estado de Direito. Não será o nosso caso.               

O primeiro dos quatro elementos do capítulo dos pedidos é a citação, ato de chamamento do réu a responder ao pedido. Devemos requerer a citação do réu para responder à demanda, sob pena de revelia e confesso, que em alguns casos não se concretizam, por tratar de direitos indisponíveis às partes.

Posteriormente, devemos nos ater ao pedido propriamente dito, desdobrando-o em mediato e imediato. O pedido mediato é o tipo tutela que se busca, declaratória, condenatória ou constitutiva, mas  é necessário requerer, antes, a sua procedência. Não confunda procedência do pedido com procedência da ação, a qual é um direito abstrato e incondicional, que independe do resultado da demanda. A tutela que se busca é a do reconhecimento da pretensão deduzida. Registre isso, por conseguinte, jamais peça a procedência da ação. É um erro comum que deve ser evitado. Ulteriormente, devemos apresentar o pedido imediato que é a providência jurisdicional almejada, por exemplo, uma indenização, o reconhecimento de uma relação jurídica ou nascimento ou ruptura de uma situação jurídica, como o divórcio, decreto de falência, etc.

Tendo ciência dos fatos e do pedido formulado, se, ainda, houver provas a serem deduzidas na fase instrutória, devemos formular na inicial o pedido de provas que serão produzidas posteriormente ao ajuizamento da ação, devendo ser salientado que todas as provas ao alcance do autor devem ser juntadas com a petição inicial. Essa regra vem sendo flexibilizada pela práxis forense, podendo a parte juntar em qualquer tempo documentos, desde que a contraparte possa se manifestar sobre elas e que se dê a juntada antes da sentença. Além disso, incorporou-se na prática judiciária a mania, para não dizer um vício burocrático dos juízes de, após eventual réplica, proferir despacho para que as partes digam quais as provas desejam produzir. O Código Processual prescreve que o autor deve fazê-lo na inicial e o réu na contestação, portanto, é uma providência despida de lógica e técnica que só rende perda de tempo e economia processual, reduzindo a marcha do processo.

Por derradeiro, deve ser consignado o valor da causa, que, em regra e quando possível, deve dimensionar o benefício econômico buscado com o processo. Em alguns casos o Código e Leis esparsas estabelecem regras que nem sempre correspondem a esta mercê, regulando a questão de forma peculiar, como ocorre com as ações de despejo e que envolvem contratos.

Devemos datar, apor o tradicional "Termos em que pede deferimento" e assinar a peça, pois uma peça apócrifa (sem assinatura) é considerada inexistente. Mas, os juízes sempre instam os desatentos a sanarem a irregularidade, antes de extinguirem o processo.

Senhores, é óbvio que não poderia deixar de atentá-lo que o trabalho do juiz é um serviço público oneroso que impõe o recolhimento de custas e emolumentos, devendo ser consultada a tabela anual de custas elaborada pela Corregedoria de Justiça dos Tribunais ou pelo Órgão estabelecido pelos Regimentos das Cortes.

Espero que tenham aprendido e apreendido a lição. Em um próximo artigo, irei tentar dar uma pincelada sobre como fazer uma contestação. Até lá!!!

 

TÉCNICA DE SENTENÇA CÍVEL